‘Vaca louca’ pode reduzir preço da carne, mas efeito seria de curto prazo, dizem economistas

preço da carne pode cair por pouco tempo

Economistas monitoram desenvolvimentos no caso de “vaca louca” no Pará para avaliar os impactos na inflação do preço da carne

A China é o maior comprador de carne bovina do país. Em 2022, absorveu 53,3% do volume de embarques e 60,9% da receita consolidada, segundo a Associação Brasileira de Frigoríficos (Abrafrigo). Exportar menos para os chineses pode significar queda do preço da carne no Brasil. Mas efeito seria de curto prazo.

Sem ter como escoar a produção para seu maior comprador estrangeiro, o mercado interno brasileiro pode sofrer um excesso de oferta de carne bovina, o que levaria a uma queda nos preços do produto, que não estão mais pressionados.

Preço da Carne Bovina

Na prévia da inflação de fevereiro, divulgada ontem, as carnes em geral (não apenas bovinas) acumulam queda de 0,70% em 12 meses, enquanto o índice cheio (IPCA-15) sobe 5,63%, e a alimentação no domicílio, 11,82%. Entre as carnes com maior peso no índice, a picanha acumula deflação de 0,46%, a alcatra 0,50% e o acém 3,71%.

“Temos sinais de que o lado da oferta está ajudando a inflação [o índice cheio], na função custo – a energia não é tão cara, por exemplo -, as commodities em reais estão nos menores patamares dos últimos 14 meses. E também temos questões pontuais, como a ‘vaca louca’, que acaba gerando um excesso de oferta de gado no país e traz risco de queda também do ponto de vista da oferta”, diz Vitor Martello, economista da Parcitas Investimentos.

Com o autoembargo brasileiro, cabe agora a Pequim dar sinal verde para a retomada dos negócios, mas não há prazo para isso. Em 2019, foram 13 dias de espera. Em 2021, mais de 100 dias.

Citando consultores, o Monitor Agro do Bradesco diz que o prazo para o fim do embargo tende a ser menor do que no último episódio.

“Vale lembrar que quanto mais prolongado o embargo, mais intensa é a queda das exportações e dos preços internos do boi gordo, mesmo que o efeito seja temporário”, diz a equipe do Departamento de Pesquisas e Estudos Econômicos.

O Vice-Presidente da República e Ministro do Desenvolvimento e Indústria, Geraldo Alckmin (PSB), que tem importante diálogo com o Agronegócio, disse ontem que “tudo indica” que o atual caso da “vaca louca” é “atípico”. Segundo ele, um exame para confirmar esse resultado deve ficar pronto até a próxima quarta-feira (1º).

Para José Augusto de Castro, presidente da Associação dos Exportadores do Brasil (AEB), um prazo para a retomada das exportações para a China até abril é realista, mas pode acontecer antes. Ele lembra que o presidente brasileiro Luiz Inácio Lula da Silva (PT) viagem programada para a China no final de março. “Lula não vai querer levar uma caixa de ‘vaca louca’ para a viagem presidencial. Estou colocando abril, mas pode ser ainda mais cedo”, diz.

Segundo Castro, neste período, o setor pode perder US$ 500 milhões em exportações. “Mas não vamos parar de exportar, vamos apenas adiar os embarques ou redirecioná-los para outros países”, pondera.

O valor estimado é bem menor do que as perdas com a paralisação de 100 dias em 2021, de cerca de US$ 1,5 bilhão, segundo Castro. Ele lembra, porém, que, naquela época, “o Brasil tinha acabado de falar umas coisas não muito agradáveis ​​sobre a China”, o que pode ter atrapalhado as negociações para liberação dos embarques.

O ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), que ocupava o Planalto à época, não poupou ataques à China, por exemplo, quando chamou a covid de “vírus chinês” e insinuou que o gigante asiático havia criado o coronavírus de propósito. “Agora, a diplomacia comercial está em paz, há uma tendência de melhorar esse prazo [de liberação]”, diz Castro.

A reportagem do Bradesco menciona que o Governo brasileiro está tentando negociar com a China um embargo apenas ao Pará, permitindo exportações de outros estados. “O Pará não é um grande produtor de carne”, observa o presidente da AEB.

Os economistas consideram que, dependendo da duração do embargo, se for curto, o preço da carne bovina pode voltar e anular qualquer ganho de curto prazo.

Se for um caso atípico, “não indica que haverá grande divulgação”, diz Fábio Romão, economista da LCA Consultores. “Exportações foram canceladas, frigoríficos pararam de abate. Isso, a princípio, poderia aumentar a oferta interna. Mas me parece algo de curta duração e não algo que vá alterar drasticamente os preços internos, pensando no ano de 2023″, diz.

Frigoríficos brasileiros estão recorrendo aos vizinhos para não ficarem parados, mostrou reportagem do Valor. A Minerva, maior exportadora de carne bovina da América do Sul, disse que atenderia a demanda da China de suas três plantas no Uruguai e sua unidade na Argentina. A Marfrig também disse que vai exportar para a China de suas seis unidades nos dois países vizinhos.

O caso de “vaca louca” foi confirmado em um animal de 9 anos – idade considerada avançada para um boi – em uma propriedade rural em Marabá (PA), que está isolada desde então..

Se confirmado, será o sexto caso atípico no Brasil em mais de 25 anos de vigilância. Um caso atípico ocorre espontaneamente em animais mais velhos, não é transmissível e não oferece risco à saúde humana. Nesses anos de vigilância, o Brasil nunca registrou um episódio clássico de “doença da vaca louca”, que ocorre quando o gado ingere produtos contendo material de origem animal (farinha de carne e ossos, por exemplo) contaminado pela doença.

Essa reportagem foi produzida pelo Valor Econômico.

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