Pesquisadora da FAO fala sobre segurança de alimentos à base de células cultivadas

Pesquisadora da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) Masami Takeuchi e pós-doutoranda Karla Oliveira (no telão)

Equipe de pesquisadores da Embrapa Agroindústria de Alimentos (Rio de Janeiro) recebeu a pesquisadora Masami Takeuchi, da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), no dia 16 de junho, quando ela fez uma apresentação sobre os aspectos de avaliação de segurança de alimentos à base de células cultivadas. Além de Massami, a pós-doutoranda integrante da equipe do projeto da Embrapa Suínos e Aves (Concórdia, SC), Karla Oliveira, falou sobre a experiência da Embrapa na produção de análogos de peito de frango a partir de carne cultivada.

Masami é coordenadora da publicação “Food safety aspects of cell-based food”, lançada pela FAO em abril de 2023, com o objetivo de abordar as principais questões de segurança antes que alimentos à base de células estejam amplamente disponíveis no mercado mundial. Segundo a FAO, desta forma, as autoridades relevantes, particularmente em países de baixa e média renda, serão equipadas com informações atualizadas e conhecimento científico sobre produção de alimentos baseados em células para considerar ações regulatórias potencialmente importantes e aprender com países experientes para que boas práticas possam ser compartilhadas.

A publicação destaca que os alimentos à base de células não são mais alimentos futuristas, pois mais de cem empresas/start-ups já estão desenvolvendo esses produtos, que estão prontos para comercialização e apenas aguardando aprovação.

Palestra

Sobre os sistemas de produção de alimentos “novos”, Takeuchi destacou os avanços científicos em rápido desenvolvimento e o surgimento de uma série de novas tecnologias com aplicações em sistemas de produção. “Produção de alimentos à base de células, impressos em 3D, editados por genes são apenas alguns dos exemplos”, disse.

Quanto ao frango à base de células, a pesquisadora lembrou que o produto foi aprovado em Singapura em dezembro de 2021; Israel está em processo para finalizar o processo de aprovação e o Qatar já aprovou instalações para produção desse tipo de alimento. A Food & Drug Administration (FDA), dos Estados Unidos (responsável pelo controle e fiscalização de alimentos, medicamentos, entre outros) emitiu um aviso de “sem mais perguntas” sobre aspectos de segurança em duas aplicações do estudo até agora. Sobre o Brasil, Masami Takeuchi afirmou ainda não ter conhecimento em relação a avanços sobre regulamentação do tema em questão.

Brasil

“O Brasil tem um grande potencial na área de pesquisa em geral, mas tenho observado, nos últimos anos, que o país não é proeminente em pesquisas sobre produtos à base de células. É interessante haver um grupo de colaboradores trabalhando nesse tema. É necessário mais diálogo multissetorial sobre o assunto, inclusive sobre regulação. Minha percepção é que as pessoas ainda não estão falando suficientemente sobre esse tema no Brasil. Se está acontecendo esse tipo de diálogo, não há informação chegando à FAO”, afirma.

Segundo ela, várias pessoas conversando sobre o tema tem sido a situação ideal em outros países, e “seria ótimo” se houvesse uma liderança para a facilitação desse tipo de diálogo no Brasil.

Identificação de perigos

Quanto aos resultados da identificação de perigos nesse tipo de alimento, ela afirmou que muitos já são bem conhecidos e, também, existem nos alimentos produzidos convencionalmente. “Por exemplo, a contaminação microbiológica pode ocorrer em qualquer estágio de qualquer processo de produção de alimentos, incluindo aqueles à base de células de animais. A maioria dos casos de contaminação microbiana, durante os estágios de crescimento e produção celular, inibe o crescimento celular. Se as células tivessem crescido e atingido as expectativas do produto para a colheita, essa contaminação não ocorreria durante o processo de produção, mas poderia ocorrer após a colheita, como é o caso de muitos outros produtos alimentícios”, explicou.

Comunicação eficaz

Segundo a representante da FAO, visando evitar possíveis confusões em relação à segurança de alimentos à base de células, é recomendado que os reguladores iniciem, o quanto antes, o processo de desenvolvimento de estratégias de comunicação personalizadas para contextualizar riscos potenciais e a probabilidade ou o grau de ameaça que cada risco pode representar. “É um momento crucial para os reguladores introduzirem alimentos à base de células aos consumidores de maneira proativa e transparente. O envolvimento contínuo das partes interessadas, o que significa que tanto os reguladores quanto os consumidores estão envolvidos na comunicação, é essencial para fortalecer a confiança que os consumidores precisam ter nos reguladores”, enfatizou.

Alimentos à base de células e demanda crescente por alimentos

Segundo informações disponíveis no Portal da FAO, a produção de alimentos baseados em células, também conhecida como agricultura celular, envolve o cultivo de células isoladas de animais seguido de processamento para fazer produtos alimentícios comparáveis às versões animais correspondentes, como carne, aves, produtos aquáticos, laticínios e ovos. Produtos alimentícios baseados em células podem ser chamados (rotulados) como “cultivado” seguido do nome da mercadoria, como carne, frango, peixe e assim por diante.

À medida que a demanda global por proteínas cresce, muitos no setor de alimentos estão buscando oportunidades para expandir o escopo de diversas fontes de proteínas que podem ser ambientalmente sustentáveis e nutricionalmente saudáveis. O cenário comercial de alimentos à base de células está se expandindo rapidamente com várias empresas desenvolvendo diversos produtos em todo o mundo.

Muitas autoridades estão trabalhando, muitas vezes em conjunto, para identificar e abordar as possíveis implicações para a segurança, de modo que estruturas regulatórias apropriadas possam ser estabelecidas para proteger os consumidores. A FAO, juntamente com as autoridades competentes, envolve muitas outras partes interessadas incluindo pesquisadores que estudam as questões de segurança de alimentos baseados em células, desenvolvedores e produtores privados de alimentos baseados em células e organizações não-governamentais para colaborar visando avançar no conhecimento coletivo.

Vinda ao Brasil

A visita de Takeuchi ao Brasil incluiu, também, a participação no International IV FoodTech Forum, ocorrido nos dias 13 e 14 de junho, no Instituto de Tecnologia de Alimentos (ITAL), em Campinas, onde apresentou palestra com o tema “Produtos à base de células: o futuro chegou?”.

Sobre a visita à Embrapa Agroindústria de Alimentos, a pesquisadora Marilia Nutti, que coordenou a vinda da pesquisadora da FAO, afirma que foi uma oportunidade para a Embrapa ter uma apresentação sobre o tema e para Masami conhecer o projeto de “carne de frango cultivada” desenvolvido pela Embrapa Suínos e Aves.

“Esperamos como desdobramentos do contato com a Masami, o fortalecimento da interação da Embrapa com a FAO, tanto institucionalmente como por intermédio de pesquisadores de áreas de interesse mútuo, como a segurança de alimentos produzidos por novas tecnologias e estratégias de comunicação de riscos a partir de estudos do consumidor”, finaliza Karina Olbrich dos Santos, chefe de Pesquisa e Desenvolvimento da Embrapa Agroindústria de Alimentos.

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